Escadas rolantes

Saindo do vagão as pessoas corriam. Eram cinco horas da tarde e elas disparavam, primeiro pela escada rolante, e quando esta enchia de gente correndo,

Leia mais »

Sobre professoras e bruxas

Eu quis ser atriz de teatro de rua, cinema, televisão. Eu quis ser balconista de papelaria
quando atravessava o portal da primeira infância. Eu quis ser americana só pra poder esbarrar
com o Donnie Whalberg do New Kids on the Block em algum beco daqueles cheios de latões
de lixo a caminho dos meus anos de freshgirl no high school. Eu já quis ser menino. No meu
caso, nada sexual. Era pra poder fazer tudo o que os meninos, rapazes, homens, “podiam
fazer” e eu não… Um dia eu ouvi com ouvidos de serval “And she was”, do Talking Heads, no
toca-discos do meu irmão. E o LP inteiro mil vezes numa fitinha no carro, “Cabeça Dinossauro”,
dos Titãs. E “Hey Jude”, na versão em português do Kiko Zambianchi, trilha da novela Top
Model.

E ouvi Twist and Shout naquele filme “Curtindo a vida adoidado”. Então eu não quis ser
mais nada, além de uma escutadora de música e frequentadora de gigs. Descobri que o hit da
novelinha não era do Kiko, era dos Beatles! E, maravilhosamente, aquela canção que fez uma
metrópole estadunidense dançar com Ferris Bueller também era. Foi o rock injetado pra
sempre na corrente sanguínea de uma jovem rebel rebel que nunca mais seria a mesma. Foi a
bomba de cereja da Joan me lambuzando com sua bad reputation. Foi a língua da maior banda
do mundo lambendo minha alma. Foi uma seringa de adrenalina no coração psicodélico da
Uma, foi o beijo muito louco, foi Londres chamando, foi a rapsódia boêmia, foi o flit
paralisante que me deixou confortavelmente anestesiada. Foi a rainha ácida cortando minha
cabeça e a bruma roxa nos meus olhos sem face. Foi o cão Falkor voando comigo, seu Atreyu-
garota, em direção ao sol do buraco negro da resistência artística, musical. Então, entre outros
quereres, resolvi que queria ser professora. Ensinar pequenos seres que cada um é um
universo, único e livre, que eles podem ser astronautas de mármore e bailarinos, meninos e
meninas, gizmos ou gremlins. Ensinar que a consciência humana e a empatia são preciosas e
salvam tudo sempre. Então eu quis ser Bruxa Moderna. E, com uma ajudinha dos meus
amigos, descobri que a arte que eu buscava era mesmo o mundo que eu queria. E que a sala
de aula é tão incrível, tão cheia de possibilidades e tão fértil quanto um palco iluminado.

Tem umas referências culturais aí nesse texto, de música e cinema, escancaradas e
escondidinhas. Uma brincadeira despretensiosa, apenas. Certeza que quem lê as postagens
desse blog vai identificar tudo!