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Hard Core Attack 2018

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Atravessei a Grande São Paulo – de extremo leste ao norte – no último sábado, 07/07, para ir à edição 2018 do Hard Core Attack, que ocorreu no Centro Cultural da Juventude (CCJ), na Vila Nova Cachoeira, zona norte de São Paulo. No entanto, me atrasei, pois havia uma importante escala para fazer: a casa em que mora meu pai, em que morei por praticamente toda a vida, ficava no meio do caminho. É sempre bom revisitar o local e a região em que crescemos.

O CCJ é um complexo artístico, esportivo e cultural bem no meio da zona norte de São Paulo, no pé da Serra da Cantareira. Quebrada, periferia, é região distante de estações de trem ou metrô: faz décadas que estas são prometidas por governadores e deputados para a região, mas as obras não passam do estágio de tapumes e desapropriações de imóveis no entorno. Para se sair do bairro e alcançar as regiões centrais de São Paulo, há linhas de ônibus que percorrem toda a Avenida Inajar de Souza e chegam ao centro, à região da Barra Funda e, em um trajeto que dura mais do que uma hora e meia, o Terminal Pinheiros.

O evento foi organizado pelo Coletivo Linces & Lobos, em parceria com o próprio CCJ (que em julho tem uma agenda especial em celebração ao “Mês do Rock”), e contou com shows de bandaças da ala mais Hard Core/Punk do underground paulista: ACruz Sesper, Deb & The Mentals, Cristo Bomba, Test e Maguerbes.

Talvez o show mais sereno da noite tenha sido justamente o que eu perdi: ACruz Sesper, com seu punk rock mais tranquilo do que agressivo, tocado pelo mestre e lendário vocal do Garage Fuzz, Alexandre Cruz.

Quando cheguei vi o saguão de entrada do Centro Cultural bem cheio, de gente e de coisa acontecendo. Era o Samuel Rato e os deliciosos chopps artesanais da Cerveja Rat, exposições e venda de trampos artísticos repletos de posturas e traços de engajamento, como as ilustrações do Matheus Maia, e os patches feitos à mão da Banned. Shapes de skate da Lodo Boards, posters, adesivos, camisetas e afins dos mestres da pop art urbana brasileira, o coletivo SHN.

Rolava também no saguão do CCJ, como parte das atividades do evento, a rapaziada da Silk Of It All, estampando a arte do cartaz em camisetas que a galera levava.

Os shows rolaram em uma sala completamente preta. Chão preto, panos pretos nas laterais, e teto preto. No fundo, no chão mesmo, tocavam as bandas, iluminadas por pouca luz.

Senti o clima do espaço de maneira muito bacana quando entrei para ver a Deb & The Mentals. Show enérgico, sempre de muito contato com o público, mais ainda rolando ali, sem palco, na base do olho no olho, corpo a corpo. Aquele cenário todo favoreceu para trazer o público para dentro de cada música. Fazia tempo que não via show dessa rapaziada, e é sempre uma boa pedida.

Levei minha camiseta para ser estampada (trampo feito com muito esmero, boto fé que em 2030 estarei vestindo a minha ainda), trombei várias figuras da cena Hard Core de São Paulo que foram importantes para que eu me tornasse o que sou, comprei mais cerveja e voltei ao corredor escuro para o show do Cristo Bomba.

Se para a Deb & The Mentals a ausência de palco foi bacana, no começo da arrebentação em desgraça do Cristo Bomba não foi tão bacana assim. O pessoal se excedeu um pouco, derrubou pedestal, rolou aqueles instantes de tensão, mas seguiu o baile com o mais puro e refinado som do Hard Core extremo com pitadas de wah na guitarra.

Mais uma volta pelo espaço, mais uma passada de olho na exposição do Matheus Maia, e quando voltei pro corredor escuro, ele não estava escuro. Havia ouvido, ainda de fora da sala onde ocorriam os shows, que havia começado o Test, e entendi como uma boa escolha a luz acesa.

Não havia palco, não havia ingressos, não havia grades, em uma região da cidade em que, geralmente, não há estado, por que haver escuridão? Mas isso é uma interpretação minha. Eram apenas dois caras tocando guitarra e bateria de um jeito fantasmagórico em um salão preto iluminado por uma forte luz branca.

É curioso como as apresentações do Test movimentam alguns sentimentos dentro de quem para e se concentra no que está acontecendo. Reparo nos detalhes e os descrevo mentalmente, como, por exemplo, a velocidade extrema a que levam a música. Observei fixamente o baterista: “Pra conseguir tocar rápido assim, deve haver algum tipo de energia do além agindo no braço deste rapaz chamado Barata”, pensei.

O modo como conseguem manipular, ritmar, desritmar e reritmar a música, é envolvente por demais. Alguns diriam que ocorre um “transe”, mas não me parece o caso – que deixo em aberto para reflexão futura em outras oportunidades em que for a show do Test.

Última cerveja, último show. Confesso que já pensava em como seria cruel a volta para casa: até chegar à Barra Funda (estação de metrô mais próxima) seriam quarenta minutos, depois ainda todo o trajeto sobre trilhos até Mogi das Cruzes…

Show do Maguerbes!!! E isso merece muitas exclamações! Show com força, com presença, com vontade. Volume alto! O Haroldo (vocal) correndo pra lá e pra cá com seu microfone de cabo amarelo que deve medir uns 50 metros, alguns mais exaltados na platéia, caindo no chão, e integrante da banda caindo junto. Uma grande farra.

Além de toda a agitação, algo que marca muito no show desses jovens rapazes senhores são as mensagens positivas. Às vezes, ali no fervo do show, as letras não são tão compreensíveis assim, mas os caras nunca se privam de falar sobre amor, amizade, fazer menções a bons e velhos e novos amigos presentes, e deixar claro que aquele show é um propósito para encontros, trocas, em suma: humanidade.

Por todo o tempo em que estive no CCJ, havia um ar de evento punk, de local seguro para quem se sente à vontade com a liberdade, com o respeito às diversidades. Essa é a mensagem que tem de ser passada nesse meio, seja em meio à calmaria, ou ao caos, seja via músicas, via traços ou estampas. Quando era um jovem que morava nesta região, e sofria com uma cidade inacessível, eventos que ocorriam em espaços como o CCJ eram um alento: a oportunidade de conhecer manifestações que comumente ocorriam apenas “Longe de casa”. E foi muito bacana, em cada volta que dava pelo corredor escuro ou pelo saguão, ver a molecada roqueira da região se deliciando com isso tudo. Como diriam os Maguerbes: temos de “Plantar sementinhas”.

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